Estes últimos meses tenho me dedicado a escrever microcontos. É uma atividade pra lá de prazerosa, juntando dois atributos que me parecem essenciais: criatividade e poder de síntese. Já possuo mais de duzentos escritos e, é claro, precisei agrupá-los. Como tenho paixão por estrelas, resolvi que cada grupo iria dar nome a uma constelação. Assim, estão nascendo a Constelação Suspense, a Constelação Humor e a Constelação Fantasia, entre muitas outras. Por sua vez, várias destas constelações farão parte de um livro que pretendo publicar em breve.
A primeira parte do livro irá constar de revisitações. Explico. Revisitei textos famosos de contos de fada, fábulas e clássicos da Literatura. Eu sei que é uma ousadia. Dar uma nova roupagem, limitada a cento e cinquenta toques, a histórias conhecidas por quase todo mundo? E mais: continuar produzindo uma emoção, mas em poucos segundos de leitura? Como assim?
Vou apresentar alguns exemplos.
Conto de Fada
Alguém não conhece a história do Chapeuzinho Vermelho? A primeira versão impressa deste conto de fada foi publicada por Charles Perrault (1628 – 1703), em 1697. No entanto, a versão mais popular é uma adaptação realizada pelos irmãos Grimm, em 1857. A história que tem uma menina, sua avó, o lobo e o caçador como personagens, já teve várias versões e ensina que não se pode confiar em estranhos.
Que tal um microconto revisitando essa história?
Essa história tem dois personagens, uma mulher (ela) e um lobo. Será que a mulher é uma menina? Será que o lobo é mesmo um animal ou seria um homem? Ela preferia usar uma roupa (capa) de outra cor – amarela -, mas se sentia (ou era) obrigada a usar a vermelha. O lobo assim queria, pois, pelo visto, a cor vermelha o atraía. Será que o lobo comia os morangos ou ficava somente admirando a sua cor? O que o lobo fará? Irá comer a mulher (menina) ou ficará só admirando? São muitas as perguntas, mas tudo indica que nessa história revisitada, a trama se aprofunda na submissão da mulher perante o homem.
Fábula
A Cigarra e a Formiga é uma das mais famosas fábulas que conhecemos desde criança. Tudo indica que foi escrita por Esopo (620 a.C. – 564 a.C.), autor da Grécia Antiga, que foi o responsável pela criação e divulgação deste gênero literário. Essa fábula também foi contada em versos pelo francês La Fontaine (1621 – 1695) e teve inúmeras adaptações, incluindo a do escritor brasileiro Monteiro Lobato (1882-1948). Ela fala sobre uma cigarra cantadeira e uma formiga trabalhadeira, comparando essas suas posturas para o enfrentamento do futuro.
Vamos revisitar a história.
Assim como na história original, o microconto apresenta os dois mesmos personagens, a cigarra e a formiga. Mas, nesse texto, a cigarra perde a voz de tanto cantar. E o que a formiga faz? Diferentemente da história original, ela não zomba nem dá lição de moral na cigarra. Ao invés disso, ela vai estudar canto! Por que faz isso? Inveja dos dotes artísticos da cigarra? A formiga quer ficar no lugar da cigarra? Ela percebe que o canto da cigarra alegrava o seu trabalho? Qual seria a trama profunda dessa história, na revisitação em microconto? Aproveitar as oportunidades que surgem em nossa trajetória? A palavra é sua. Se quiser, responda nos comentários.
Clássico da Literatura
Desde 1943, ano de sua primeira publicação nos Estados Unidos, O Pequeno Príncipe, do escritor francês Antoine de Saint-Exupéry (1900 – 1944), foi traduzido em mais de cento e sessenta idiomas, sendo um dos livros mais vendidos do mundo. A novela conta a história da amizade entre um homem mais velho frustrado por ninguém compreender os seus desenhos, e um jovem principezinho que habita um asteroide no espaço. É um livro ao mesmo tempo filosófico e poético, apresentando frases antológicas, mostrando a perda da inocência e da fantasia com o passar dos anos.
Neste grande clássico, a proposta do microconto é esta:
Aqui, o jovem personagem cansa de cuidar de sua rosa. Pelo visto, dá muito trabalho. Ele viaja, então, para outro asteroide, à procura de novos ares, novas relações, novas atividades. Será que encontra? Tudo indica que não, pois volta para o asteroide antigo. Será que sentiu saudade de sua rosa, de cuidar dela? Qual seria a relação do principezinho com a sua flor? Do que ele teria sentido falta? A trama profunda deste microconto é não procurar em uma nova relação o que já se construiu em uma antiga relação. Cada uma possui a sua riqueza. Resta saber qual riqueza nos satisfaz mais.
Agora, responda a enquete: qual dos microcontos você preferiu, o do conto de fada, o da fábula ou o do clássico da Literatura? Escreva no comentário!
Bem, espero que tenha gostado desta pequena degustação do meu próximo livro a ser pulicado em agosto ou setembro. Em breve, você terá outras degustações, beliscando algumas estrelas de outras constelações.
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Até a próxima!
Fábula. Achei perfeito, em especial para nós, autores em começo de jornada. O cantar é como o escrever, tem tanto ou mais espaço que qualquer outro "trabalho". Aliás, dá muito mais trabalho que outras atividades tipo CLT, exige entrega, exige alma, exige o melhor de nós, o que realmente importa... e por isso, às vezes dói!!!
Catherine, amei este post. Os três microcontos ficaram lindos e adorei as referências históricas de cada um deles. Fica difícil escolher um, pois os três são maravilhosos. Mas seu microconto tendo como referência Chapeuzinho Vermelho é avassalador, porque ele traz uma dubiedade, uma sensualidade, ao mesmo tempo que mantém a ideia de ameaça que o lobo (seja ele quem for) carrega em si... Tudo isso em tão poucas palavras... simplesmente fantástico! Parabéns!